Terapia pra que?




Comportamento infantil
Como, e quando, dizer “não”?
(Parte final)
 
 
Na edição de agosto da Bem-Estar trouxemos uma entrevista com a psicóloga Luciana Gomes de Abreu, que há 13 anos atua em consultório particular com atendimentos individuais, a casais e famílias. Falamos sobre a dificuldade que os pais encontram em dizer “não” aos filhos, o momento em que as crianças passam a ter maior noção dos limites impostos, e como melhor direcionar o processo de obediência e aprendizagem.
Como o tema é amplo, dividimos a entrevista em duas partes, e a parte final você confere aqui. Negociar, oferecer recompensas, o que realmente vale na hora de impor limites aos filhos? As respostas a estas e outras perguntas você lê agora.
 
Bem-Estar: O castigo físico não é mais cogitável na atual sociedade em que vivemos. Quais as formas que os pais podem usar para conseguir "negociar" com seus filhos?
Luciana Abreu: Castigar fisicamente os filhos é uma forma que os adultos encontraram de aliviar sua tensão e sua frustração. Realmente acredito que não se aprende somente através da dor e, quando os pais usam este meio, agem impulsivamente, automaticamente, e acabam ficando sem a possibilidade de realmente ensinar seus filhos, pois eles não aprendem com as consequências de seus erros. Quando uma criança apanha, ela não entende o porquê de não poder fazer algo, aprende somente a evitar a dor da palmada. Quando estamos falando de colocar limites, mencionar a palavra “negociação” pode parecer contraditório. Afinal, se você estiver dirigindo um carro a 140 km por hora, não poderá negociar com a polícia uma velocidade um pouco abaixo, algo como 120 km por hora para não ser multado. Negociações só devem ser feitas quando os pais assim escolherem, e não a mando da criança ou para evitar birras. Se isso acontecer aos três anos de idade, a chance de continuar acontecendo aos 18 anos será grande. Melhor do que "como negociar com seu filho", seria pensar "para que" negociar com seu filho naquele momento? Para ele não chorar? Para ele não sofrer? Para ele aprender a lidar com a consequência da escolha que ele está fazendo? Se for uma família mais rígida, onde as regras não podem ser quebradas, onde os erros são inaceitáveis, negociar pode ser o aprendizado. Ensinar a criança a flexibilizar algumas regras e negociar outras pode ensiná-la a lidar com futuros desafios. Se for uma família onde as regras são bastante flexíveis, talvez manter algumas regras sem negociações seja importante.
 
Bem-Estar: Oferecer recompensas é uma boa forma de conseguir com que obedeçam a ordens simples, tais como fazer a tarefa, dormir na hora certa, guardar os próprios brinquedos?
Luciana Abreu: Não acho que a recompensa deva ser uma regra, pois se  assim for logo os pais estarão presos a ela. As regras, quando cumpridas, trazem consequências que devem ser salientadas e lembradas para a criança. Mais importante do que ser recompensada é a criança ter consciência que a escolha dela teve uma consequência e que trouxe benefícios. As crianças precisam enxergar que seus sacrifícios valeram a pena, às vezes simplesmente por ter ajudado a mãe a ficar mais descansada e feliz.
 
 
Bem-Estar: Quando é mais difícil fazer com que os filhos respeitem os limites impostos pela família: na infância ou na adolescência?
Luciana Abreu: Acredito que cada fase exige posturas diferentes. A criança exige limites, mas também ensinamentos de como lidar com a raiva, a tristeza e a dor de não conseguir o que quer. O adolescente exige mais negociações, conversas sobre lidar com as escolhas e se responsabilizar pelas consequências. De forma mais simplista, poderia dizer que  na infância estamos aprendendo e na adolescência treinando o que já se aprendeu. Por isso a importância de se aprender desde pequeno que limites e regras existem e são importantes, assim como o que fazer com os sentimentos gerados por elas. O maior aprendizado que uma pessoa pode ter na vida é a de que se faz escolhas o tempo todo, e que cada escolha traz consigo uma responsabilidade, uma consequência.
 
Bem-Estar: Qual a melhor maneira de lidar com adolescentes quando o assunto é a imposição de limites?  Qual a melhor forma de chegar até eles, de ser compreendido?
Luciana Abreu: Os pais têm o direito e o dever de definir limites, ordens e regras conforme o que acreditam. Mas também precisam dar autonomia para que seus filhos possam treinar suas competências na vida. Exercer o poder só para provar quem manda trará uma guerra desnecessária. O respeito e a compreensão devem vir dos dois lados. Agora o filho está crescido, tem suas opiniões e desejos, tem uma forma de resolver seus problemas, e isso não é ruim. Ele quer transformar, modificar. Este movimento é fundamental para que esta família cresça e evolua. Se não fosse este movimento, estaríamos vivendo ainda em um mundo onde os pais escolhiam as profissões e os casamentos dos filhos! Conversar com seu filho exige que você fale e que esteja aberto a ouvir e respeitar, e não somente ouvir e criticar. Claro que todos os pais sonham e criam expectativas sobre seus filho, por isso é necessário permitir que o filho seja uma pessoa real, com seus erros, dificuldades e limites, e que os tão famosos diálogos entre pais e filhos não sejam sermões onde somente um fala. Abrir espaço para que pais e filhos  se conheçam melhor, troquem experiências, flexibilizem algumas opiniões e deixem  claro quais regras os pais não abrirão mão, pois realmente acreditam nelas, é muito importe. Caso os pais tenham dificuldade em ter uma conversa com seu filho e isto esteja causando prejuízo à família, ou ao próprio desenvolvimento de seu filho, é importante que  procure um psicólogo e busque auxílio para realizar alguma aprendizagem necessária.

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